Está cada vez mais difícil comer “boshintang” em Seul.
Repórter do G1 provou e conta como foi.
Encontrar um restaurante em Seul que venda pratos feitos de carne de cachorro (“boshintang”, em coreano) não é uma tarefa fácil. E mais difícil ainda é encontrar um coreano que goste desse tipo de refeição.
Ao contrário do que se pensa, a Coréia do Sul, que ao longo dos anos foi estereotipada como “o país onde se come cachorro”, vê como algo cada vez mais distante o consumo do polêmico prato.
“A Coréia está muito mais aberta ao mundo e as pessoas estão vendo o que acontece aqui. Além disso, esse costume (de comer carne canina) vem caindo porque hoje em dia é muito normal ter cachorros em casa”, afirma o jornalista Sung-Hae Kim, especializado na história dos costumes da Coréia do Sul.
Ele, que tem 40 anos e nunca provou o prato, diz que o consumo da carne é algo que faz parte da cultura do país, mas que está mudando rapidamente por causa das transformações sociais pelas quais a Coréia passou nos últimos anos.
“É verdade que algumas pessoas ainda adoram o prato, mas é cada vez mais raro encontrar lugares que vendem essa carne aqui em Seul. A sociedade está mudando sua maneira de pensar e simplesmente há menos gente comendo esse prato”, afirma Kim, lembrando que todos os países tem suas “estranhas tradiçoes”: “Na China, por exemplo, há quem coma ratos.”
Cardápio de restaurante em Seul mostra os pratos feitos de cachorro (Foto: Pablo López Guelli/G1)
O prato
A carne de cachorro é uma tradição milenar na Coréia do Sul. Come-se com mais freqüência no verão porque ela supostamente dá energia e é facilmente digerida pelo corpo.
O prato costuma vir em forma de ensopado, com a carne cozida dentro e muitos vegetais. A carne em si é macia, mas não é especialmente saborosa.
A maior parte dos restaurantes que servem carne de cachorro na Coréia estão no interior do país, o que torna mais difícil o acesso a estrangeiros.
No centro de Seul é até arriscado perguntar onde se pode comer carne de cachorro. É provável que se receba uma resposta ríspida ou mal-educada de garçons e donos de restaurantes -como os insultos ouvidos por este repórter.
A estudante Sooyyon Chung não conseguiu comer o "boshintang" (Foto: Pablo López Guelli/G1)
Ocidentalizado
O estudante Byun Yoon-woo, de 20 anos, é outro exemplo de como a sociedade coreana está mais “ocidentalizada” quando o assunto é carne de cachorro.
“Cachorro é um companheiro, não uma refeiçao”, diz Yoon-woo. “Eu nunca provei, e todas as meninas que conheço têm nojo desse prato. Para a nossa geração, esse é um costume muito estranho”, afirma o coreano.
Outra estudante, Sooyon Chung, de 21 anos, conta que há algum tempo passou pelo “desafio culinário de provar cachorro”. E não passou no teste. “Na época eu estava saindo com uma pessoa e decidimos ir a um restaurante especializado em cachorro. Mas na hora de pedir a comida ficamos com medo e não pedimos o prato”, diz Chung.
Cachorro da raça Hwang-gu, usado para fazer o "boshintang" (Foto: Reprodução)
Copa do Mundo
A discussão sobre o consumo de carne de cachorro, que é repudiada por milhões de pessoas em todo o mundo, colocou a Coréia do Sul em evidência antes da Copa do Mundo de 2002.
Na ocasião, até a Fifa chegou a fazer um pedido formal para que o governo coreano tomasse providências contra o “abate cruel de cachorros” -algo que é denunciado freqüentemente pelas associações dos direitos dos animais do país.
Desde então, o costume que já vinha perdendo força caiu ainda mais, mas não desapareceu completamente, para desespero de milhares de defensores dos direitos dos animais em todo o mundo.
Esses defensores alegam que os cachorros são criados em gaiolas, como as galinhas -especialmente para o consumo de sua carne. Afirmam também que os animais são torturados antes de serem mortos porque dessa forma a adrenalina liberada aumenta o sabor da carne e, principalmente, a virilidade dos homens que a consomem.
* O jornalista Pablo Guelli, repórter do G1, viaja a convite do governo sul-coreano, que custeia parte de suas despesas.
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